domingo, 20 de fevereiro de 2011

A saga dos guerreiros cósmicos


É uma lástima. Infelizmente, a banda britânica de space rock Hawkwind ainda é muito desconhecida aqui no Brasil. Apesar de ter tido dois LPs lançados por estas plagas (o incontornável Warrior of the Edge of Time e o ao vivo Live 1979, além de uma faixa na coletânea nacional Metal Heroes), o grupo nunca tocou na rádio – e muito menos se apresentou por aqui. Realmente uma pena.

Formado em 1969, em pleno auge da cena psicodélica britânica, o Hawkwind buscava personificar o ideário pós-hippie da época. Ou seja, todo mundo morava junto, com muito sex, drugs and rock’n’roll, sem ligar para as limitações do “sistema”. O grande diferencial é que a banda sempre evoluiu, seja usando tecnologia, chamando grandes figuras da época para colaborar (como o escritor de fantasia e ficção científica Michael Moorcock ou o poeta Robert Calvert), ou ainda inovando nos shows, com efeitos de luzes, performances teatrais e shows de dança.


A formação clássica, em meados dos anos 70, tinha nada mais nada menos do que Lemmy Kilminster, que depois seria expulso e criaria um tal de Motörhead (que é o nome de uma música sua para o Hawkwind). No entanto, nesses mais de quarenta anos, já passaram dezenas de músicos, em passagens tumultuosas – como o batera do Cream, Ginger Baker, que gravou o disco Levitation em 1980.


Um pouco dessa história foi resgatada no livro The Saga of Hawkwind, de Carol Clerk (editora Omnibus Press, 2006). Apesar de só disponível na Gringolândia (e com chances totalmente impossíveis de sair por aqui), o livro traça um completo panorama da banda – passando inclusive pelas brigas intestinas e pelos litígios jurídicos, que colocaram dois de seus maiores cérebros pensantes – o guitarrista Dave Brock e o saxofonista Nik Turner – em campos opostos. O texto também é uma boa pedida para se ver como são as negociações com as gravadoras, as passadas de perna dos bastidores, as roubadas das turnês etc.


O livro só peca por não se focar muito no lado musical propriamente dito. Ou seja, discutir influências com mais profundidade, colocar a trajetória do Hawkwind em perspectiva com o que acontecia (hard rock dos anos 70, discoteca, punk, new wave, cena alternativa, metal, música eletrônica). O grande assunto, da metade para o final das mais de 500 páginas da obra, é a disputa dos velhinhos que passaram pelo grupo por grana, dinheiro, bufunfa, larjã. Ou, como Lemmy disse a respeito disso: “No final, os guerreiros cósmicos se preocupam mais com dinheiro”. Um banho de água-fria nos ideias representados pela banda, mas também uma lição de como rola o fantástico mundo do rock’n’roll. Recomendado.


E não se esqueça de conferir os discos da banda – especialmente da fase áurea: X In Search of Space (1971), Doremi Fasol Latido (1972), Hall of the Mountain Grill (1974), Warrior on the Edge of Time (1975), 25 Years On — Hawklords (1978), Levitation (1980), Sonic Attack (1981) ou The Chronicle of the Black Sword (1985), por exemplo. E o essencial ao vivo Space Ritual (1973). Os caras ainda estão na ativa, e os ex-integrantes também se mobilizam em vários projetos que tocam músicas da banda. Vale a pena dar uma conferida.